terça-feira, 16 de abril de 2013


BACABAL@CULTURA.SEM




RUA GRANDE

Arregaço as mangas
Da minha camisa de força
E olho sobre
As milhares de cabeças de gente
Que se cruzam
Como se fossem formigas
No quintal do esquecimento.

Sobre o asfalto
Milhões de pés calçados.
Sobre as calçadas
Os passos em falso
Sob o asfalto e sob as calçadas
Alguma pedra portuguesa
Deixada por algum forasteiro
Que fará o papel de tesouro enterrado
Esquecido no tempo.

Duendes doentes
Habitantes do fundo da terra
Montam um quebra-cabeças
Que forma a arquitetura
De um passeio público
Cheio de traços mal feitos
E de curvas sinuosas.

Raízes de fícus, benjaminas, amendoeiras
Jambeiros, acácias, flamboyants
Embrenham-se a sete palmos do chão
E sugam os escarros
Cuspidos de bocas famintas, sedentas
De uma palavra verdadeira.
Suas folhas respiram
Fumaça de gasolina
De álcool, de óleo diesel
De gás butano, de carvão mineral,
De cigarros, de papeis queimados.

Grita o camelô
Apresentando seus produtos de terceira
Bichos circulam entre gente,
Passeiam como fossem
Parte principal dessa paisagem urbana.

Vendem-se de tudo:
O brilho falso dos metais,
Das bijuterias.
Perfumes sem cheiro, unguentos
Vendem-se rádios, discos, toca discos
Panelas, pratos, colheres, talheres,
Frutas, bandecos
Roupas, relógios, óculos, miudezas.

Vendem-se futuroastrsvés das cartas
Dos búzios, das linhas das mãos.
Vendem-se alma,
Bilhetes premiados
Terrenos no céu
Vendem-se até a mãe.

Corre entre pernas
A falsa impressão
De que esta Rua Grande
(Tão pequena e tão estreita)
Leva a um futuro próximo
Que embrulho para presente
E guardo no fundo do bolso
Da minha calça de brim desbotado.

Zé Lopes
Do livro “Bacabal Alves de Abreu Souza Silva de Mendonça e da Infância Perdida”

 

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