quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

JORNAL TURCO PUBLICA CHARGES E SOFRE AMEAÇAS



Sob críticas e ameaças, jornal 'Cumhuriyet', da Turquia, dedicou quatro páginas à mais recente edição da revista francesa.

A edição da revista francesa Charlie Hebdo publicada após o atentado em que militantes islâmicos mataram oito de seus funcionários foi lançada em seis idiomas, entre eles árabe e turco.

Mas, enquanto a versão em árabe se restringiu à internet, o diário turco Cumhuriyet, jornal de esquerda e alinhado com políticos da oposição secular, dedicou quatro páginas à nova edição da revista francesa.
Assim, a Turquia tornou-se o único país muçulmano em que foram publicadas as charges da Charlie Hebdo.

O jornal reuniu o que chamou de "seleção especial" de caricaturas, mas deixou de fora a capa da edição francesa que trazia um desenho do profeta Maomé.

No entanto, dois de seus colunistas, Ceyda Karan e Hikmet Çetinkaya, publicaram a imagem da capa no topo de suas colunas, em um tamanho bem menor do que o original.

O Cumhuriyet informou que a polícia turca realizou uma batida em sua gráfica na noite de terça-feira, mas que a distribuição do jornal foi permitida depois que os policiais tiveram certeza de que nenhuma charge envolvendo Maomé estava na seleção feita pelo diário.

O jornal diz ter recebido várias ameaças e que seus escritórios foram colocados sob proteção policial. 

Seleção de caricaturas não incluiu capa da revista com profeta MaoméOs dois colunistas justificaram o uso da capa da Charlie Hebdo com Maomé dizendo ser preciso defender a separação entre religião e Estado e que a liberdade de expressão no país está em declínio sob o atual governo.

A decisão dos colunistas gerou muitas críticas nas redes sociais.

A hashtag #ÜlkemdeCharlieHebdoDağıtılamaz ("não à distribuição da Charlie Hebdo em meu país", numa tradução livre) foi parar entre os dez assuntos mais comentados no Twitter em todo o mundo.

Críticos do jornal questionam se a publicação estaria disposta a "ridicularizar" Kemal Ataturk, o fundador secular da Turquia moderna, que é protegido por uma controversa lei antidifamação, vista por muitos turcos muçulmanos islâmicos como uma forma de censura.




Entenda o que diz o islamismo sobre a publicação de imagens de Maomé e Alá e por que isso causa tanta polêmica.
POR QUE AS CHARGES DE MAOMÉ CAUSAM TANTA REVOLTA?
 
A revista francesa Charlie Hebdo publicou uma nova charge do profeta Maomé em sua primeira edição após o trágico ataque a sua redação em Paris, realizado por extremistas islâmicos que disseram estar "se vingando pelo profeta" depois que charges parecidas apareceram na publicação.


A nova capa mostra Maomé derramando uma lágrima e segurando um cartaz em que se lê "Eu sou Charlie", uma mensagem de solidariedade às vítimas. A imagem vem acompanhada da frase "Tudo é perdoado".

A edição especial - com tiragem recorde aumentada para 5 milhões - gerou críticas de líderes islâmicos e novas ameaças de morte contra seus funcionários, como ocorreu com um jornal dinamarquês em 2005 depois de serem publicadas charges satirizando Maomé.

Mas por que charges desse tipo podem ser consideradas tão ofensivas?

O que diz o Corão

Não há no texto sagrado dos muçulmanos uma proibição de que sejam retratados o profeta Maomé ou Alá, o deus islâmico.

No entanto, o verso 11 do capítulo 42 do Corão diz: "(Alá é) o criador dos céus e da terra...(não há) nada semelhante a Ele".

Isso é interpretado por muçulmanos como uma mensagem de que Alá não pode ser retratado em uma imagem feita por mãos humanas, dada sua beleza e grandeza.

Leia mais: Demanda amplia para 5 milhões tiragem da 'Charlie Hebdo' 

Tentar fazer isso é considerado um insulto a Alá. O mesmo é aplicado a Maomé.

Os versos 52, 53 e 54 do capítulo 21 ainda afirmam: "Abraão disse a seu pai e a seu povo: 'O que são estas imagens a cuja adoração você se apega?' Eles disseram: 'Encontramos nossos pais as adorando'. Ele disse: 'Certamente, você e seus pais vêm comentendo um erro'".

Daí vem a crença islâmica de que imagens levam à idolatria - no sentido de que uma imagem, e não o ser divino que ela representa, passa a ser o objeto de adoração e veneração.

O que diz a tradição islâmica

O Hadith - histórias das palavras e ações de Maomé e seus Companheiros - explicitamente proíbe imagens de Alá, Maomé e todos os principais profetas do cristianismo e o judaísmo.
De forma mais ampla, a tradição islâmica desencoraja a retratação figurativa de criaturas vivas, especialmente seres humanos.

Por isso, a arte islâmica tende a ser abstrata ou decorativa.

A tradição islâmica sunita é bem menos severa quanto a isso. É possível encontrar reproduções de imagens do profeta, produzidas principalmente em persa no século 7.

Como se deu a polêmica em torno das charges

Houve grandes protestos no mundo islâmico em 2005 depois que o jornal dinamarquês Jyllands-Posten publicou 12 charges de Maomé junto com um editorial que criticava a autocensura.

Algumas delas pareciam ser deliberadamente provocativas. Uma mostrava Maomé carregando na cabeça, em vez de um turbante, uma bomba com o pavio aceso e uma inscrição da declaração de fé muçulmana.

Muitos muçulmanos viram as charges como uma mostra de uma crescente hostilidade e medo na Europa contra adeptos do islamismo.

A retratação de Maomé e de muçulmanos em geral como terroristas foi considerada particularmente ultrajante.

Em 2011, a sede da Charlie Hebdo foi alvo de um ataque a bomba depois de ter mudado seu nome para "Charia Hebdo" - um trocadilho com "Sharia", ou lei islâmica - em uma edição em que convidava Maomé para ser seu editor-chefe.

No ano seguinte, a revista publicou uma edição com diversas charges que mostravam Maomé nu, enquanto ocorria no mundo uma revolta generalizada com o lançamento de um filme antiislã.

Um trailer do filme, Inocência dos Muçulmanos, colocado no YouTube, provocou uma série de protestos e episódios de violência em vários cantos do mundo, que, por sua vez, deixaram dezenas de mortos.
 

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